Condições de trabalho pioram no setor carcerário durante a pandemia

A ISP Interamérica organizou, em 20 de outubro, um intercâmbio entre organizações sindicais filiadas que representam as e os trabalhadores penitenciários no Brasil e nos Estados Unidos. O evento contou com representantes e trabalhadores de SINDCOP e SINDPSI, do Brasil, e da AFT, dos Estados Unidos.

Uma delegação internacional da American Federation of Teachers (AFT) visitou o Brasil em novembro de 2019, poucos meses antes do início da pandemia global. Representantes participaram de uma audiência pública na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo, participaram em um seminário sobre as consequências de privatização no setor, realizaram coletivas de imprensa e visitaram presídios em São Paulo.

Este segundo evento foi uma oportunidade para acompanhar e consolidar o trabalho que foi iniciado em 2019. O presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários de São Paulo (SINDCOP), Gilson Barreto, informou que as ameaças de privatização no Brasil se intensificaram desde o último intercâmbio. Barreto disse que, "apesar da clara necessidade de intervenções governamentais fortes e sistemáticas durante a pandemia, a lógica predominante continua a ser um Estado mínimo para os trabalhadores e um Estado ativista e intervencionista para os ricos".

Wayne Spence, vice-presidente nacional da AFT e presidente da Federação dos Funcionários Públicos de Nova York, acrescentou, argumentando que a privatização, por menor que seja, acaba por criar um incentivo estrutural para privatizar mais serviços públicos e aumentar as taxas de encarceramento. "O que vemos em toda parte é que, uma vez privatizadas, o modelo de lucro dessas empresas é o encarceramento em massa, portanto, elas precisam de mais pessoas para serem presas. Elas retiram lucros do sistema para fazer lobby para medidas que aumentem o encarceramento. Isso se torna um ciclo interminável. Você tem de alimentar a besta". Spence destacou que a AFT poderia compartilhar estratégias e pesquisas sobre como limitar e impedir a privatização no setor.

Um dos resultados do intercâmbio de 2019 no Brasil que foi reiterado durante o seminário do último 20 de outubro foi o fato de que toda vez que as coisas dão errado tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos, o setor público é chamado a resgatar as empresas privadas que não estão equipadas para lidar com as crises. A experiência da ISP no mundo inteiro demonstra que isso também acontece quando outros serviços públicos como água e eletricidade, educação e serviços de saúde são privatizados. Os riscos permanecem públicos enquanto os lucros são privatizados.

Os trabalhadores e trabalhadoras do setor nunca tiveram a opção de trabalhar de home office durante a pandemia. As condições de trabalho complicadas e desafiadoras pioraram muito e rapidamente quando a covid-19 chegou. Assistente regional da ISP Interamérica, Euan Gibb destacou um caso do estado da Geórgia nos EUA que foi divulgado em setembro de 2020. Uma enfermeira local chamada Dawn Wooten, que trabalha no Centro de Detenção Irwin, sofreu uma despromoção e um corte de salário depois de revelar problemas crônicos que pioraram drasticamente durante a pandemia. A enfermeira trabalha para a LaSalle Corrections, que administra 18 centros de detenção em todo o Sul dos Estados Unidos. Wooten tornou-se denunciante depois de expor a subnotificação sistemática dos casos de covid-19 e a recusa da empresa a testar os detentos, colocando conscientemente funcionários e detentos em risco de contrair o vírus enquanto limitavam o acesso ao equipamento de proteção pessoal (EPI) a ambos os grupos, negligenciando as queixas médicas e dispensando os testes positivos. Wooten foi acusada de "desperdiçar testes" quando os solicitou para os detentos.


O trabalho global da ISP em apoio aos denunciantes inclui influenciar a política global, defendendo uma norma na Organização Internacional do Trabalho e uma diretiva da União Europeia para proteger a independência dos trabalhadores, órgãos de controle e os empregos dos denunciantes. A ISP apoia e participa em campanhas que fortalecem o movimento dos denunciantes e incentiva os sindicatos filiados a se envolverem.


Chris Runge, diretor da Divisão de Funcionários Públicos da AFT, destacou que a política é importante. Runge enfatizou a diferença de eleger um presidente que apoie mais a legislação e as políticas que apoiam o movimento sindical. Uma explicação para a grave ameaça que representa a união do forte movimento antivacina com a extrema direita foi oferecida como um alerta. Fernanda Magano, presidenta do Sindicato dos Psicólogos de São Paulo (SINPSI-SP), confirmou a importância do papel dos governos e do Estado em geral. Magano relatou os ataques sistemáticos ao setor público brasileiro em nível nacional, estadual e municipal. "Estamos sobrevivendo a uma pandemia e a um pandemônio político; os ataques estão vindo de todos os lados simultaneamente. Ela explicou como o congelamento das contratações e a terceirização generalizada são utilizadas para privatizar os serviços públicos sem qualquer tipo de processo formal ou licitação.

Por último, Jacinto Coutinho, presidente da Associação dos Policiais Penais do Brasil (AGEPPEN) apresentou o trabalho que o SINDCOP e sua associação têm feito para garantir o reconhecimento legal dos oficiais de correção. Eles estão trabalhando para que o setor seja regulamentado e profissionalizado, com um papel central para os sindicatos nesse processo.