Brasil: Trabalhadores/as da limpeza urbana fazem greve por vacina em São Paulo

Cerca de 17 mil profissionais de limpeza urbana do município de São Paulo (SP) realizaram uma greve de 24 horas no último dia 8 de junho. Eles e elas reivindicam o direito de serem vacinados contra a covid-19.

Em 20 de abril de 2021, o Ministério da Saúde incluiu no Programa Nacional de Imunizações (PNI) esses e essas trabalhadores, também conhecidos como garis. A decisão beneficiou 255.256 profissionais em todo o país, mas a decisão veio tarde, fazendo com que tenham trabalhado expostos ao vírus por mais de um ano. 

Mesmo após a inclusão no PNI, os garis de São Paulo ainda não haviam recebido a vacina até o dia da paralisação. Até agora, 2 mil trabalhadores da limpeza urbana da capital paulista se infectaram com covid-19, e ao menos 60 morreram em decorrência da doença, segundo dados do Sindicato dos Trabalhadores em Empresas de Prestação de Serviços de Asseio e Conservação e Limpeza Urbana de São Paulo (SIEMACO). 

Para efeito de comparação, em janeiro a cidade de Indore, na Índia, com cerca de 2.160.631 habitantes, já anunciava que seus profissionais da limpeza seriam os primeiros a serem imunizados contra a covid-19, segundo o jornal The Times of India

Exposição ao vírus

Essencial para a limpeza adequada das cidades e, logo, fundamental para o bem-estar de seus habitantes, a categoria é uma das mais expostas ao vírus, já que essa atividade não poder ser feita por teletrabalho. Municípios como Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Manaus, São Vicente, Jaboatão dos Guararapes e Santos já começaram a vacinação desses profissionais. 

Em entrevista ao Estado de Minas, Alam Ricardo, de 33 anos, trabalhador da limpeza de Belo Horizonte, foi um dos vacinados. “A imunização é um alívio, tanto para mim quanto para minha família. Não tem explicação”, afirmou. “No meu serviço, meu contato é mais com colegas de trabalho. Não tenho contato com outras pessoas para parar e conversar. É coisa rápida, serviço de gari é assim. Mas é um risco, né? Agora é continuar tomando as medidas que já estava tomando, com álcool e máscara. Não podemos relaxar”, disse o trabalhador. 

Em nota enviada ao TAB UOL, a prefeitura de São Paulo afirmou que os novos grupos incluídos no programa de imunização nacional dependem da chegada de novas doses de vacina, enviadas pelo Ministério da Saúde. 

Em entrevista à Internacional de Serviços Públicos (ISP), José Moacyr, tesoureiro do SIEMACO, conta mais sobre a luta dos trabalhadores e trabalhadoras de limpeza urbana da cidade de São Paulo: 

Quais são os principais problemas que a categoria enfrenta e quais as reivindicações prioritárias? Isso mudou na pandemia ou as reivindicações são as mesmas? 

Durante a pandemia, a principal preocupação é com a saúde dos trabalhadores e trabalhadoras. Antes, durante e depois da pandemia as principais reivindicações continuam sendo a manutenção de nossas conquistas (assistência médica, vale-refeição, alimentação etc.) e salário mais justo. 

Vocês realizaram uma forte greve de 24 horas no dia 8 de junho em defesa do direito à vacina para trabalhadores e trabalhadoras da limpeza urbana. Como a greve foi organizada e qual foi o papel do sindicato?

Fizemos um protesto sanitário em função da falta de consideração das autoridades para com a nossa categoria, que é linha de frente. Conseguimos mobilizar praticamente 100% dos trabalhadores/as com o intuito de demonstrar nossa insatisfação. Coube ao SIEMACO pressionar o governo do estado e a prefeitura para priorizarem a imunização de nossa categoria.  

José Moacyr, tesoureiro do SIEMACO
José Moacyr, tesoureiro do SIEMACO

Por que os/as garis ainda não estão sendo vacinados/as em São Paulo?

 Todas as respostas que obtivemos é que os governos estaduais recebem as vacinas do Ministério da Saúde e as distribuem para os municípios que seguem um cronograma de vacinação. Infelizmente, apesar de sabermos que realmente é esse o sistema, não conseguimos entender como várias outras categorias consideradas essenciais foram atendidas quando pressionaram o governo do estado, vide o caso dos motoristas de transporte urbano, ferroviários e metroviários, mas nós não. E é exatamente por esse sentimento é que continuaremos pressionando o governo para que nossos trabalhadores e trabalhadoras sejam tratados com o devido respeito e consideração. 

A frase “Não somos invisíveis'' foi muito falada e divulgada durante a greve. Há uma invisibilidade dos trabalhadores e trabalhadoras do setor? E por quê? 

Os trabalhadores e trabalhadoras sentem na pele a discriminação enquanto uniformizados/as e a total invisibilidade quando estão sem uniformes. Parece que a população só enxerga nossos/as trabalhadores/as quando o lixo não é recolhido de suas residências, do comércio e dos serviços. A tese da invisibilidade foi criada pelo psicólogo Fernando Braga da Costa, quando durante um período se vestiu de gari e varreu as ruas da USP. 

Não conseguimos entender como várias outras categorias consideradas essenciais foram atendidas quando pressionaram o governo do estado, mas nós não 

Houve alguma abertura para negociação ou resposta da Prefeitura de São Paulo diante da reivindicação da vacinação? 

Estamos negociando com o governo do estado e a prefeitura desde o início da pandemia. Enviamos diversos ofícios, inclusive para o Ministério da Saúde e para a Câmara Municipal de São Paulo, porém, nunca obtivemos uma resposta positiva. 

Quais são os próximos passos da categoria na luta por acesso à vacina? 

Continuamos nossa luta pela vacina, em contato permanente com a AMLURB [Agência Municipal de Limpeza Urbana] e com o secretário Municipal de Saúde, Edson Aparecido. A antecipação da vacinação da população por faixa etária já ajudou um pouco, pois vários integrantes de nossa categoria estão sendo vacinados. 

Um dos garis entrevistados pela mídia afirmou: “Entro em greve para não morrer mais ninguém”, uma afirmação comovente. Quais os números de trabalhadores/as da limpeza urbana de São Paulo infectado/as e mortos/as por covid-19? 

Tivemos, até o início de junho, cerca de 2 mil casos, com, infelizmente, 60 óbitos. 

O SIEMACO fez um pedido de filiação à ISP que muito nos orgulha. Como o senhor avalia a importância de uma maior organização sindical internacional para enfrentar esse momento difícil da conjuntura brasileira? 

Já temos uma experiência de relação sindical internacional com a UNI Global Union, sindicato global da área de serviços. Temos acompanhado algumas ações da ISP, que nos interessou muito e achamos muito importante fazer parte da comunidade sindical mundial. Temos certeza de que será uma ótima parceria.