Brasil: a luta pela reestatização da Eletrobras

Depois de um longo processo, a privatização da maior empresa de energia da América Latina foi concretizada em 2022, sob o comando do governo nefasto de Jair Bolsonaro, com consequências tanto para o setor elétrico brasileiro, quanto para a população em geral. A reestatização da empresa está em pauta desde as eleições de 2022

A Eletrobras produz cerca de 38% da energia consumida no Brasil, principalmente nas regiões norte e nordeste, com usinas distribuídas em todo território nacional. Somando cerca de 18 mil funcionários, entre contratados, prestadores de serviços, estagiários e aprendizes. No relatório anual de 2022, a empresa cita a redução de 20% no quadro de trabalhadores através do plano de demissão voluntária, oferecido aos colaboradores após a privatização e com o objetivo de diminuir os gastos da empresa.

A primeira vez em que se falou sobre privatizar as subsidiárias da Eletrobras, foi durante o mandato de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), ideia barrada durante os governos petistas de Lula da Silva e Dilma Rousseff (2003-2016) e retomada durante a posse de Michel Temer (2016-2018). Mas só se concretizou durante o governo de Bolsonaro, que ainda candidato negava que privatizaria a empresa.

Com a privatização da Eletrobras, o governo Bolsonaro prometia reduzir o valor da conta de luz dos consumidores residenciais, o que aconteceu durante os primeiros meses logo antes de aumentar ainda mais. A explicação para essa oscilação é simples: parte do lucro da venda da estatal foi destinado à Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) - fundo setorial custeado pelos consumidores através de taxas incluídas nas contas de energia. O investimento na CDE após a privatização da Eletrobras anulou a taxa destinada a ela, diminuindo temporariamente o valor das contas de energia que já voltaram a subir.

Além disso, a privatização foi responsável por demissões em massa, seguidas de terceirização de contrato. Segundo Paulo de Tarso, presidente da Confederação Nacional dos Urbanitários - CNU, a terceirização é responsável pela péssima qualidade dos serviços, e por mais acidentes de trabalho e morte. “O que se espera [com a terceirização] é isso, uma decadência do setor de trabalho, e hoje a sociedade está gritando pela qualidade do serviço prestado”, declarou.

Em seu primeiro ano de governo, o presidente Lula da Silva chegou a afirmar publicamente que a privatização da Eletrobras foi um “crime de lesa pátria”, feito de uma forma que impeça o governo de tomar o controle da estatal de volta. Isso porque, hoje o governo é detentor de 43% das ações da empresa, mas participa das votações com poder de apenas 10%, o que significa que, apesar de deter uma porcentagem acumulada maior da empresa, o governo tem o mesmo poder de voto que os outros acionistas. Além disso, caso o governo queira comprar mais ações, paga o triplo do valor estipulado para qualquer outra empresa. Em maio, o governo Lula questionou essa cláusula perante o Supremo Tribunal Federal (STF), em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), movida pela Advocacia-Geral da União (AGU).

Como estão atuando os sindicatos

A vice-presidente da CNU, Fabíola Antezana, explicou que o sindicato tem atuado na luta pela reestatização da Eletrobras em quatro frentes: na política, no jurídico, internamente e na imprensa. Na política, com audiências públicas e debates a fim de demonstrar para o congresso os prejuízos que a privatização já trouxe para a sociedade e para os trabalhadores. No aspecto jurídico, buscando maneiras de judicializar as ações que a Eletrobras tem tomado já como empresa privada. Internamente, o trabalho é tentar minimizar a precarização do trabalho que passou a ocorrer logo após todo processo de privatização - principalmente em relação às demissões -, e demonstrar para o governo que, por falta de pessoal especializado, o sistema elétrico nacional corre riscos.

A sindicalista explicou, ainda, que para a reestatização acontecer, é necessário que um novo Projeto de Lei seja discutido no Congresso Nacional, mas que o cenário político atual não é favorável para que isso ocorra. Sendo assim, a melhor maneira para alcançar esse objetivo é expor as inconstitucionalidades encontradas no processo de privatização.

Fabíola Antezana afirmou que essa é “uma situação claramente problemática e única no mundo: no processo de privatização houve um prejuízo para a união, uma vez que a lei determina que nenhum acionista pode votar com um poder de voto acima de 10% independentemente do número de ações [o Estado ficou com 43% das ações]”. Antezana lembra, no entanto, que a lei não pode retroagir para prejudicar ninguém. “Essa é uma questão interpretativa, a partir do momento em que a lei entra em vigor vale para os acionistas daqui para frente, inclusive a união, mas teria que resguardar o que ela já tinha, até porque a união não foi indenizada pela externalização dessas ações”, disse. Além disso, o governo ficou responsável como agente garantidor de qualquer coisa que venha acontecer com a Eletrobras, sendo o único acionista responsabilizado por decisões tomadas em assembleias.

Os próximos passos já estão pautados, com audiências públicas para debater o objetivo da Ação Direta de Inconstitucionalidade, além de uma série de denúncias sobre o processo que prejudicou o governo. No último dia 5, aconteceu um ato em defesa da Eletrobras enquanto empresa pública, no Rio de Janeiro. Sandro Alex, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social (CNTSS), afiliada da ISP, participou do ato e relatou que foi um ato foi bastante significativo, por ser o primeiro ato após o movimento do governo federal em tentar retomar o seu poder acionário na empresa. “O ato teve o condão de restabelecer o equilíbrio da participação do governo”, afirmou.